quarta-feira, 20 de outubro de 2010

A revolução das cores

Os adultos do inicio da década de 90 devem ter assistido boquiabertos àquela massa de jovens que saiu pelas ruas, com as caras pintadas, exigindo o impeachment do então presidente Collor. Da mesma forma, a geração de minha avó (que nasceu na década de 40), deve ter se surpreendido com as mocinhas de 60 queimando sutiãs por ai. Ou os da década de 10, que viram os vestidos e ternos darem lugares a roupas mais curtas e despojadas (e apropriadas para o nosso clima). Todas essas gerações têm algo em comum com a minha: a sensação que estamos vivendo uma época de mudanças – uma época em que a geração seguinte surge e põe abaixo todos os paradigmas antes construídos.
                A marca dessa geração que surge e que a torna facilmente identificável é a profusão de cores com as quais ela se veste. Lembro que quando era adolescente haviam as cores de meninos e as cores de meninas e ai de quem ousasse ultrapassar essa barreira (imposta por não sei que idiota). Aos poucos essa fronteira foi sendo superada e hoje vivemos mais do que nunca na época do “arco-íris”. A turminha de hoje conseguiu quebrar o preconceito que havia em torno do assunto e agora é cor para todo lado – do cadarço do tênis ao cabelo, passando pelos mínimos detalhes do corpo. Mas ai é que surge a grande dúvida: relativizaram o preconceito com as cores, mas será que o preconceito no qual ele se baseia (sobre a diversidade sexual) caiu por terra também?
                Não dá para negar que os ventos que sopram hoje estão bem diferentes dos de outrora. Os jovens não estão mais coloridos só por fora, estão por dentro também. Os preconceitos têm sido superados diariamente e eles estão bem mais abertos a assumir suas preferências sexuais para a sociedade e para a família. A minha geração tinha o ato de “sair do armário”, como um estigma, um tabu (tanto que a maioria ainda continua lá, rodeados de naftalina) – a de agora, tem um ambiente muito mais propício e aberto para se aceitar: os armários de hoje estão bem escancarados para quem quiser olhar para dentro.
                Isso não quer dizer que a intolerância não exista mais – grupos, principalmente ligados a algum seguimento religioso, ainda encaram as relações homossexuais como doença ou pecado e acreditam que elas degeneram a sociedade. Nesse contexto, a onda que varre a juventude não se reflete em políticas de promoção da diversidade sexual. Só para citar um ponto, a Constituição Brasileira reconhece apenas a união entre homem e mulher como entidade familiar (há ainda as famílias monoparentais que são as formadas por um dos pais e seus descendentes), então, qualquer casal homossexual que queira ter algum direito relativo à sua condição de convivente tem que fazê-lo sob a forma de sociedade – no Brasil, a lei trata o gay como empresa e não como pessoa. Fora outros direito que são negados como o de adoção, ou até mais simples como o de demonstrar carinho em publico sem sofrer nenhum tipo de agressão física ou moral.
                Confesso que é difícil entender o posicionamento desses grupos religiosos. Tratar um gay como um doente, degenerado ou criminoso é ir de encontro a um dos principais fundamentos do cristianismo: o de amar o próximo acima de todas as coisas. Além do mais negar-lhes direitos é destruir o pilar mais básico de qualquer Estado Democrático de Direito, o qual diz que “Somos todos iguais perante as leis”.
                No entanto, mesmo com toda essa campanha que ainda existe contra os homossexuais, sinto que vivemos uma revolução silenciosa – de um lado o colorido das novas idéias e do outro o obscurantismo de doutrinas já ultrapassadas. Aos poucos caminhamos para uma maior tolerância e respeito uns com os outros. Sinto que essa geração, ou mesmo a outra após essa, vem para enterrar de vez o preconceito sexual ainda existente.
                Por fim, cabe lembrar que há alguns séculos, o pensamento iluminista foi de encontro ao modelo de sociedade vigente e nos deixou como herança a “Declaração Universal dos Direito do Homem”: primeiro documento em que se estende a todas as pessoas direitos básicos como a vida, a liberdade e o patrimônio. Quem sabe daqui a mais alguns séculos as pessoas não olharão para trás, para os nossos dias, e dirão que esse foi o século das cores: aquele em que as pessoas deixaram de ser discriminadas por conta de suas preferências sexuais e se tornaram definitivamente iguais que, em verdade, é o que somos.
                

Nenhum comentário: