quinta-feira, 7 de outubro de 2010

Preconceito, blog, Bruna Surfistinha e outras histórias.

Me emprestaram “O doce veneno do escorpião” da Bruna Surfistinha para eu ler. Já tive oportunidade de lê-lo em outras ocasiões, mas confesso que tive uma boa dose de preconceito e nunca me interessei pela leitura. Preconceito não pelo fato dele ser escrito por uma garota de programa, mas porque, quem me indicou, não soube explicar seu conteúdo e disse apenas que era um livro onde rolava “muita putaria”. Então, se era somente putaria, bastava eu entrar na net e ver um filme pornô qualquer que seria bem mais divertido. Contudo, dessa vez resolvi apostar na leitura e, para surpresa minha, ganhei algumas horas bem divertidas com o livro em mãos.
                A primeira vista, e como não poderia deixar de ser, já que ele é o livro-diário de uma garota de programa, a putaria rola solta sim – e que ótimo que isso acontece. Precisamos de uma vez por todas desmistificar o sexo, tirar dele essa áurea sagrada que as religiões impuseram e encará-lo apenas como algo natural, algo humano. Todos temos nossas fantasias e desejos, e no livro eu pude ver o quanto escondemos isso, o quanto deixamos de lado nossas vontades apenas para mantermos uma postura para a sociedade – sociedade esta que nem liga para nenhum de nós. Seriamos muito mais felizes se nos permitíssemos mais, se abandonássemos um pouco nossos pudores e medos: viveríamos com muito menos problemas psicológicos, neuras e “pesos nas costas”.
                Porém, o que mais me chamou a atenção no livro e me prendeu uma tarde toda, foi a história da menina por trás da garota de programa. Nunca passei pelo que ela passou (adoção, pais ausentes), então não tenho como me colocar no lugar dela, porém percebi que tínhamos duas coisas em comum. A primeira é um sentimento que eu chamo de “solidão acompanhada” que é aquela em que, mesmo rodeado de várias pessoas, nos sentimos solitários – um vazio interior que nenhuma companhia preenche. Além disso, por ser filho único, criado por pais separados, e pela falta de diálogo em casa, tive que descobrir muitas coisas sozinho, ou através dos amigos – e ai reside nosso segundo ponto de interseção: a ausência de diálogo em casa ajudou a moldar aquilo que somos hoje.
                Outro ponto do livro que me fez refletir bastante foi o quanto certas decisões que tomamos nos fazem percorrer caminhos que, talvez, nunca imaginamos percorrer um dia. Pelo que li, quando mais jovem, nunca passou pela cabeça dela ser prostituta. Em verdade, acredito que nenhuma pessoa se prostitua por prazer – sem nenhum preconceito com a “profissão”, mas eu já fiquei com pessoas pelas quais não tive afinidade alguma e sei o quanto é ruim, até mesmo repugnante. Imagine, então, fazer isso várias vezes e em troca de dinheiro – no mínimo é preciso muita coragem e força de vontade. Por isso temos que ter muito cuidado com as escolhas que fazemos...  é claro que a vida nos impõe tomadas de decisões cada vez mais rápidas, mas é preciso refletir muito antes de pular de cabeça em certas coisas – elas podem não ter volta.
                Além disso, vi na menina que se prostituiu uma força surpreendente. Sei o quanto é difícil ir de encontro às regras morais da sociedade, mas sei que, para ser feliz é necessário às vezes romper barreiras, nadar contra a corrente. Nem todo mundo tem peito suficiente para fazer isso, e a maioria vive mesmo de sonhos não realizados. É claro que não estou aqui incentivando ninguém a passar a vida toda fazendo loucuras, mas da mesmice e do óbvio não surge nada e fazer a diferença num mundo cada vez mais igual é necessário de vez em quando.
                Por fim, cabe lembrar um outro ponto de identificação entre o Bruno que vos fala e a Bruna Surfistinha – ambos usamos um blog para dar vazão a todo sentimento represado. Tudo aquilo que não encontra outro meio de sair, seja por falta de coragem ou por falta de ouvidos, está aqui escrito. Nunca tive a pretensão que alguém lesse e gostasse dos meus textos, queria apenas ter onde colocar todos os pensamentos que me povoam e que, por falta de espaço, nem sempre dá pra segurar. E foi através dessa ferramenta que encontrei a válvula de escape que tanto precisava. No mais, fica a minha indicação – leiam “O doce veneno do escorpião”, é um livro curto e surpreendente, excitante e comovente. Pode não ser um grande clássico, mas com certeza renderá algumas horas de prazerosa leitura. 

3 comentários:

Ricardo Konká disse...

Nossa! Como é interessante descobrir que algumas pessoas tem algo mais que um rostinho bonito, um certo carisma, sorriso de bobo mas que sabem ler e escrever o próprio nome. O mais bacana, e interessante no sentido de "bacanal" é que as vezes no meio de uma misturada de coisas, de gente, de objetos e de alguns focos desfocados, conseguimos ir além quando nos deixamos conhecer e acreditar no que o outro nos oferece. Vou ser um visitante assíduo Bruno, fiquei muito feliz em saber que desenvolve outras coisas interessantes que vão muito além do seu sorriso carismático.

@Brun0Bastos disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
@Brun0Bastos disse...

Muito bom o texto, Bruno. Você demonstra de uma forma muito clara e prática a essencia do livro ao comparar-lo com sua vida. Gostei muito das reflexões e do intusiasmo com o qual você descreve a história da qual seria a ex-garota de programa (assumida) mais famosa do Brasil. Tinha lido o inicio do livro mais nunca cheguei a concluir a leitura, mas acho que agora - com o interessece renovado- irei sentar e terminar o que comecei.