quarta-feira, 29 de junho de 2011

Sobre egoismo, espaço público e outras histórias

                Ontem eu vi uma cena, que á primeira vista é comum, mas que não me passou despercebida. Uma garotinha, mais ou menos com cinco anos de idade, com um papel na mão, fez uma bolinha deste papel e a jogou no chão proferindo a seguinte frase: “não presta mais, vou jogar no lixo”. Porém não foi no lixo que ela atirou, foi no chão mesmo, na frente de sua mãe que nada falou, não a repreendeu, não fez absolutamente nada e a bolinha de papel ficou, assim como muitas outras coisas, no meio da rua.
                Pouco depois, já de volta ao trabalho, estávamos conversando sobre datas comemorativas, sobre a matéria educação moral e cívica que se ensinava na escola antigamente e que hoje não se ensina mais. Acredito que quase ninguém mais deve saber o porquê de alguns feriados, ou cantar certos hinos, como o da independência, ou o da bandeira. Enfim, o patriotismo que se exercitava antes, hoje se encontra esquecido sob o véu de certas políticas educacionais que eu não entendo e que não é a função desse texto comentar.
                Pois bem, se você continua lendo até aqui deve estar se perguntando o que as duas histórias acima têm em comum... Pois bem, vou explicar.
                A falta de amor pela pátria e a descrença nas instituições só tem aumentado nos últimos tempos e, com isso, aumenta também o desdém e o descaso pelo espaço público, pelo bem comum. Por isso cada vez mais vemos o lixo se espalhando pelas ruas, as depredações em praças e monumentos, os muros e postes virando banheiros. Em suma, o espaço comum virou terra de ninguém. Se não há um sentimento de pertença, de posse pela coisa, as pessoas começam a pensar que podem fazer o que quiser, inclusive destruir esta coisa. E é isso o que vem acontecendo com as nossas cidades, cada vez mais dilapidadas.
                A garotinha talvez nem tenha consciência do que fez, para ela foi apenas mais um papel jogado ao chão. Mas se ninguém a corrige, se a mãe ali presente não a corrige, vai ser assim que ela vai crescer, sem entender que o espaço público não pertence a ela (pelo menos não só a ela) e veremos mais e mais lixo espalhado por todos os cantos, e cheiro de urina em vez de flores nas praças.
                Esse sentimento de desdém pela coisa pública é ainda agravado pela indignação que nos acompanha a cada vez que um escândalo de corrupção ou de desvio de dinheiro vem à tona. Passa-se a compreender que, se nem aqueles que são responsáveis por resguardar o patrimônio publico o fazem, então não cabe a ninguém fazer. Ou mais, passa-se a entender que, se o político pode se apropriar de algo que é público, então todos podem também tirar uma “casquinha” ou proveito desses bens.
                É ai que se cria garotinhas como aquela lá de cima. Que vai crescer achando que jogar lixo no chão é normal, que quebrar o banco de uma praça não é nada demais, ou que urinar na árvore de um canteiro não é uma coisa absurda. Cria-se (e muitos deles já estão aparecendo) os “cidadãos do foda-se”.
                Esses cidadãos são os que, ao utilizar o espaço público, não se ligam que esses espaços pertencem não somente a eles, mas a todos em conjunto. Então, ao urinar em um poste e receber um olhar de repreensão, eles logo bradam, “foda-se quem não está gostando”. Quando jogam um lixo na rua, eles pensam, “foda-se quem achar ruim, foda-se o gari que vai varrer, foda-se se esse papel vai entupir algum bueiro”. Quando picham um monumento eles pensam, “foda-se a beleza das coisas, foda-se o mundo”.
                Uma pessoa aqui do trabalho resumiu bem a sociedade em que vivemos: uma sociedade egoísta. Cada vez mais nos fechamos em torno de nós mesmo, em torno de nossas coisas que nos esquecemos de olhar para o lado. Um movimento demonstra bem esse egoísmo que nos rodeia: a cada dia aumenta a quantidade de pessoas que, dentro dos ônibus, não usam mais o fone de ouvido e ligam seus celulares a todo volume pra escutar música, pior que isso, além de ligar o celular, alguns estão acoplando auto-falantes para o som ficar mais potente. E, mais uma vez, “foda-se” para os outros.
                Por fim, não sou um especialista, nem quero com esse texto apontar os erros de ninguém, ou dizer que não há outros motivos para os nossos males sociais. Quero apenas dizer que, com um pouco mais de educação, de respeito pelo próximo e pelo espaço comum é que poderemos vencer a ignorância que nos permeia. Quem sabe assim poderemos ter a esperança de viver em uma cidade melhor, com mais beleza e aroma, enfim, sonhar com um futuro melhor para todos.

Um comentário:

Anônimo disse...

Você sabe a resposta para isto tudo (os problemas) e está aqui:

"A garotinha talvez nem tenha consciência do que fez, para ela foi apenas mais um papel jogado ao chão. Mas se ninguém a corrige, se a mãe ali presente não a corrige, vai ser assim que ela vai crescer, sem entender que o espaço público não pertence a ela (pelo menos não só a ela) [...]."

é só pensar que a mãe talvez tenha sido a mesma garotinha mal-ensinada de 5 anos há, sei lá, 30/40 anos atrás. Acredito que quanto menor a escolaridade e tudo mais, essas coisas se repitam com maior frequência (não que os de alta esc. sejam sempre educados, mas a chance sobe). Ocorre que infelizmente boa educação é mercadoria de luxo. Só uma minoria tem acesso.

E outra questão. Será que o espaço público é da garotinha mesmo? Em tese, sim, mas também o acesso aos espaços públicos é diferente para os diversos componentes sociais. Sem mencionar a tendência a privatização de tudo (ainda mais com a copa). Se a regra é o desleixo com sentimentos de coletividades ou coisa do tipo, vira um ciclo vicioso, afinal, por que logo "eu" serei a exceção e pagarei de mártir? "Eu" que já tenho tantos problemas na minha vida pra lidar. Se ninguém - inclusive poder público - não me respeita, por que vou respeitar?

assim, fica pregado o imobilismo? Não. Acho que o mal se corta pela raiz. No caso do Brasil, um verdadeiro fim da escravidão. Só isso gerará cidadãos, ao meu ver.